VULCÃO NÃO EXISTE ABEL NEVES, DRAMATURGO
A génese de “Vulcão” está numa conversa que a Custódia Gallego teve comigo num dia de Maio há já uns anos. Perguntou-me então, simplesmente, se eu gostaria de lhe escrever um texto para o teatro, um monólogo. Sei que lhe disse que prefiro o diálogo e recordo-me que me disse que também ela prefere o diálogo. Estávamos, por isso, bem esclarecidos. A verdade é que todos nós praticamos a arte do monólogo, uns mais do que outros, mais em murmúrio uns do que outros, uns mais capazes de se fazerem ouvir, muitos irremediavelmente perdidos no enigma deste mundo. Valdete, a personagem que acabou por revelar-se nos primeiros passos de “Vulcão”, não tem uma vida feliz mas, apesar da infelicidade, está determinada a conquistar um apaziguamento que lhe permita reconquistar o seu supremo bem: um filho perdido. A crer nas suas palavras, irá consegui-lo e talvez seja bom estarmos simpáticos com quem não desiste de encontrar justiça, talvez até uma espécie de céu na terra, mas cada um saberá de si no que diz respeito também aos outros. E humanidade não falta por aí. “Vulcão” não é mais do que uma história que nunca existiu, mas que a fascinante disponibilidade de corpo e espírito de uma actriz consegue trazer ao palco para que possamos, talvez, não só restaurar - e para melhor - as arruinadas vidas de muitos como precaver-nos - em muitos casos também - contra os malefícios de algumas acções e que, afinal, até têm bom remédio. Não é que o teatro faça milagres, porque não os faz, mas ajuda a pensar outras vidas, possíveis e melhores, e a clarear horizontes. Nós, os que com o público andamos no teatro, ainda vamos acreditando nisso.